Entre o artista, a plateia, o espelho e narciso.

Eco e Narciso

Jung já apontava pra uma dimensão linda da da vida. O mundo, a alma do mundo, a anima mundi é reflexo do nosso interior. O mundo que vemos, os atores que escolhemos, o sol, a lua as estrelas, o estranho que nos fala o amigo que começa a falar sem saber o porque e por fim. as sincronicidades, os sonhos. Todas as imagens são imagens de nós mesmos.

Ontem eu caminhava com uma amiga que me trouxe um grande presente, o passado presente. Explico. Nos conhecemos há 15 anos atrás. Ela falava enquanto caminhávamos que queria gravar aquela lembrança, a bela imagem na praia e levar sempre consigo. Eu lhe disse, que esse lugar é que a via passar, quem está de passagem somos nós, que passamos pela vida dos outros, como dizia Exupery: “deixado um pouco de nós e levando o outro consigo”. Embora sejamos também um pouco raposas e um pouco pequenos principes com suas rosas em redomas de vidro. 🙂

Assim também, a paisagem, eu falava, é que deveria nos ver crescer e alcançar, pouco a pouco a maturidade de nós mesmos.

E as borboletas?

Bem, borboletas no estômago…

Será mesmo nescessário borboletas no estômago?

O artista na infância, pinta, dança, canta pra atender aos pais, nossa plateia por excelência. Na adolescencia, se faz objeto para o outro, se torna artista, ou mesmo diretores teatrais para que outros incorporem seus sonhos e suas dores, talvez por excesso de sensibilidade, talvez por covardia mesmo, talvez os dois.

Na maturidade, creio eu, o artista é criativo porque isso lhe é o viver. É assim, canto porque  o pássaro canta. Se faço uma pintura é porque sonho, se traço uma mandala é porque o mundo ao meu redor precisa de ordem, como a ordem interna.

Assim é com narciso. Você conhece a história, não é?

Se não, vou resumir como me aprece (apraise), vou só recontar como me encanta.

– Narciso era muito bonito e todos o invejavam-amavam.

– Um dia ele caminhava por um bosque e encontrou uma ninfa, chamada Eco.

– Eco não suportou que narciso não a quisesse e lhe atraiu para um lago.

– Lá, narciso olhou sua imagem se apaixonou. E alí morreu.

Onde narciso morreu nasceu uma flor, que conhecemos. O que poucos sabem é que de narciso, narké, vem também a palavra narcótico. Tudo que vicia em nós mesmos, sejam nossas imagens, nossas fotos, nossos perfis virtuais, nosso estilo de vida. Tudo que não morre, mata.

Assim, cada flor que morre, é a lembrança da nossa finitude beleza, da nossa imagem que não se suporta, da nossa fragilidade infinita.

Tenho convivido com tantos artistas iluminados. De verdade, gente que brilha ao se reparar, ao se olhar atentamente. E de tanto brilho pra fora, tanta, tanta escuridão pra dentro.

Não parece óbvio isso, na vida das pessoas imagem, das “personalidades”,  alguém de verdade queira uma vida como a do outro ao invés da sua própria, seu prórprio gosto, seu próprio sal, seu próprio saber, seu próprio sabor.

Imagem e semelhança. Ator e plateia, imagem e objeto, sujeito e por fim o mundo, não dual.

Me lembrei de Alice através do espelho. Quando vamos atravessar o espelho de nós mesmos, perceber que estamos num grande salão de espelhos e ver além da matrix?

Qual o custo disso, de atravessar o espelho? Saber que agora e sempre, você vai querer mais do que qualquer outra coisa, ajudar tantos e tantos outros a atraversar seus espelhos.

O narcisimos do outro se torna um narcismo de si que é o narcismo do outro que o reflexo que é a morte que é a imortalidade florescente!

Sem torpor, sem temor, sem espetáculo, se expectativa, sem espera, não um, não dois.

“Um lindo jardim…

Para deus em nós vir pousar…

Para deus conosco brincar.”

Game is over.

About The Author

Mario Fialho

Mário Fialho é pai do Miguel Luz, professor na multiversidade, clínica e escola em Niterói. Vive dedicado a escrever, ensinar e a cuidar de tudo que é bom, belo e verdadeiro com simplicidade. E agradece a sua visita.